Protocolo de Angiotomografia – TAVI (Transcatheter Aortic Valve Implantation)

 





Objetivo do exame

A angiotomografia para TAVI tem como finalidade avaliar detalhadamente a anatomia da valva aórtica, raiz da aorta, aorta torácica e abdominal, além das artérias ilíacas e femorais, que são as principais vias de acesso para o implante da prótese valvar. O exame também permite mensurar o anel aórtico, avaliar calcificações e planejar a estratégia de acesso vascular.

Técnica e Fases do Estudo

O protocolo é composto por duas aquisições principais:

  1. Angiotomografia de aorta torácica e raiz aórtica

    • Avaliação da valva aórtica, seios de Valsalva, junção sino-tubular e aorta ascendente.

    • Objetivo: mensuração precisa do anel aórtico e análise da relação com estruturas adjacentes (coronárias, seios de Valsalva e óstios coronarianos).

  2. Angiotomografia de aorta toracoabdominal e vasos ilíaco-femorais

    • Avaliação do trajeto de acesso vascular (desde a aorta até as artérias femorais).

    • Objetivo: identificar estenoses, calcificações, tortuosidades e o diâmetro luminal dos vasos.

Parâmetros Técnicos Sugeridos

ParâmetroValor sugerido
Modo de aquisiçãoHelicoidal ou volumétrico (64 cortes ou mais)
kVp100–120 kV (ajustado pelo biotipo)
mAAutomático com modulação
Espessura de corte0,5–0,625 mm
ReconstruçãoIncremento de 0,4 mm, algoritmo de alta resolução
Pitch0,9–1,2 (ajustado conforme equipamento)
Tempo de rotação0,28–0,4 s
Campo de visão (FOV)Focado no coração na fase torácica; ampliado até artérias femorais na fase periférica

Contraste e Injeção

ItemParâmetro
Tipo de contrasteIodado não iônico (≥ 350 mgI/mL)
Volume total70 a 120 mL (ajustado conforme peso e protocolo de dupla fase)
Fluxo de injeção4,5 a 6,0 mL/s
Fase salina30 a 50 mL de soro fisiológico a 4,5–6 mL/s (pós-contraste)
Punção venosaVeia antecubital direita, calibre 18G, preferencialmente
SincronizaçãoTécnica bolus tracking com ROI na aorta ascendente, disparo automático ao atingir 150 HU
Tempo de aquisiçãoInício imediato após o limiar de 150 HU; aquisição caudo-cranial ou cranio-caudal conforme o protocolo do serviço

Anatomia e Estruturas Avaliadas

1. Fase Torácica (valvar e aórtica)

  • Ventrículo esquerdo e via de saída.

  • Valva aórtica (número de cúspides e calcificações).

  • Anel aórtico e diâmetro dos seios de Valsalva.

  • Junção sino-tubular e aorta ascendente.

  • Óstios coronarianos (altura e distância do anel).

2. Fase Aorto-ilíaco-femoral

  • Aorta descendente torácica e abdominal.

  • Artérias renais.

  • Artérias ilíacas comuns, externas e femorais.

  • Avaliação de calcificação, tortuosidade, estenoses e diâmetros luminais mínimos (critério fundamental para via de acesso).


Fase Torácica (valvar / raiz aórtica)

Estruturas fundamentais e como identificá-las em TC

  1. Ventrículo esquerdo e via de saída (LVOT – Left Ventricular Outflow Tract)

    • O LVOT é a região que conecta o ventrículo esquerdo à base da valva aórtica. É fundamental avaliar sua geometria, inclinação e eventual presença de hipertrofia septal.

    • Em cortes oblíquos adequados, visualiza-se o septo interventricular junto ao limbo da valva, e a transição entre o ventrículo e o anel aórtico.

    • Eventuais calcificações ou protuberâncias septais próximas à via de saída devem ser anotadas, pois podem interferir no posicionamento da prótese.

  2. Valva aórtica (cúspides / número de cúspides / calcificações)

    • Normalmente a valva aórtica tem três cúspides (direita, esquerda e não coronariana). Em alguns pacientes pode haver valva bicúspide (importante detectar).

    • Em reconstruções multiplanares e cortes oblíquos do plano valvar, pode-se ver as cúspides e seus calcificações (pontuais ou extensas).

    • A densidade de calcificação (avaliação qualitativa ou semiquantitativa) é crítica porque cúspides muito calcificadas ou nodulares podem influenciar expansão da prótese ou risco de ruptura/lesão.


    Na imagem superior esquerda (imagem de plano axial/obliquo), você pode ver três cúspides destacadas por setas (figura com valva trícuspide) — é um exemplo de como identificar a morfologia valvar.

  3. Anel aórtico / Seios de Valsalva

    • O anél aórtico é o “círculo” virtual definido pelos pontos nadir (os pontos mais baixos) das cúspides da valva aórtica — é o plano de implante usual da prótese. É geralmente elíptico, não perfeitamente circular.

    • Medições no anel incluem os eixos maior e menor da elipse, perímetro e área (reconstruções multiplanares no “plano do anel”).

    • Os seios de Valsalva ficam logo acima do anel, correspondendo às bolsas entre as cúspides. É importante medir o diâmetro dos seios (em várias direções) e a profundidade, pois isso influencia a acomodação da prótese e o risco de interferência com os óstios coronarianos.

    Na imagem 3 (imagem superior direita), há mostra de uma elipse com comprimentos nos eixos — isso ilustra como se mede o anel (ex: 31,19 mm × 24,47 mm).

  4. Junção sino-tubular (STJ) / Aorta ascendente inicial

    • A junção sino-tubular é o estreitamento entre os seios de Valsalva e a porção tubular da aorta ascendente. Medir seu diâmetro e observar se há disfunção, fusão ou dilatação ajuda no planejamento da forma de ancoragem da prótese.

    • Também se mede a aorta ascendente (proximal) para verificar sua conformação e se há dilatações ou curvas abruptas que possam comprometer o posicionamento da prótese.

    • Deve-se observar o grau de coaxialidade entre o eixo do anel e a aorta ascendente — desvios angulares podem dificultar o implante.

  5. Óstios coronarianos (altura e distância ao anel)

    • Criticamente, deve-se medir a altura dos óstios coronários em relação ao plano do anel aórtico (distância perpendicular entre o plano do anel e o ponto de origem dos óstios coronários). Isso porque, ao expandir a prótese e empurrar as cúspides calcificadas, há risco de obstrução coronária se a altura for pequena.

    • Um valor mínimo de ~8 a 10 mm é frequentemente apontado como critério de segurança para dispositivos como SAPIEN (dependendo da marca) para evitar obstrução coronariana.

    • Além da altura, avalia-se a projeção da cúspide (comprimento da cúspide) porque cúspides muito longas e calcificadas podem interferir mesmo com altura aceitável.

    • Verifica-se também a distância lateral entre o óstio e o anel, bem como o posicionamento relativo das cúspides e o espaço disponível.

    Na imagem “Assessment of the height of the coronary ostia relative to the aortic annular plane” (segunda imagem do carrossel) nota-se claramente o plano do anel (linha pontilhada) e o óstio coronariano com a distância vertical medida.

  6. Dispositivos de reconstrução 3D / centerline / curvilíneas

    • A partir dos dados volumétricos, são feitas reconstruções multiplanares (MPR) inclinação oblíqua para alinhar o plano do anel, reconstruções “along the centerline” da aorta para seguir seu trajeto e avaliar eventual tortuosidade.

    • Renderizações 3D permitem visualizar o sistema valvar e coronário numa perspectiva anatômica, útil para planejamento de implante (ângulos, orientação, visualização de calcificações proeminentes, etc.).

Fase Aorto-Ilíaco-Femoral (Trajeto vascular de acesso)

Essa fase cobre desde a aorta descendente até as artérias femorais, criando o mapa vascular de acesso para o cateter e guias.

  1. Aorta descendente (torácica e abdominal)

    • Avalia-se diâmetro luminal, presença de placas de ateroma, calcificação mural, ulceras ou disseções, bem como tortuosidade do trajeto.

    • Em reconstruções curvilíneas, cria-se uma “linha central” para seguir o trajeto da aorta e permitir medições ao longo do caminho.

    • Segmentos com estreitamentos, oclusões ou dilatações devem ser identificados e quantificados.

  2. Artérias renais

    • Não diretamente parte do trajeto de acesso, mas importante para planejamento renal (função, irrigação), e para evitar contrasto excessivo.

    • Também se avalia proximidade de placas, envolvimento calcificado e variações anatômicas (ex: artérias acessórios) que possam impactar a dose de contraste ou a perfusão pós-procedimento.

  3. Artérias ilíacas comuns, ilíacas externas / artérias femorais (comuns e superficiais)

    • Aqui está o “ponto crítico” do acesso vascular. Deve-se medir o diâmetro luminal mínimo interno (em cortes perpendiculares ao eixo do vaso), preferencialmente ≥ 5,5–6,0 mm (dependendo do dispositivo) para acomodar o cateter guia / bainha.

    • Avaliar a calcificação mural (ex: placas densas, buracos de calcificações), tortuosidade (curvas agudas no trajeto), curvas helicoidais, angulações e subtrações de lumen.

    • Notar estreitamentos focais ou lesões estenosantes e registrar o comprimento das estenoses e sua gravidade.

    • Em reconstruções curvilíneas, pode-se “desdobrar” o vaso e rotacionar ao longo de seu comprimento para inspeção visual facilitada.

  4. Avaliação combinada: calcificações, tortuosidade e estenoses

    • A calcificação é quantificada qualitativamente (leve, moderada, severa) ou utilizando pontuações de densidade (se possível). Variações pronunciadas de densidade e aderência mural podem dificultar a passagem da bainha.

    • A tortuosidade é um fator de risco para complicações vasculares (dissecções, ruptura) e pode exigir rota alternativa (transapical, trans-ilíaca).

    • Estenoses focais devem ser mapeadas em localização exata, grau (%) e extensão.

  5. Reconstruções visuais / renderizações

    • Utilizam-se reconstruções “vasa realçadas” e técnicas de volume rendering para exibir todo o trajeto vascular com gradientes de cor, destacando áreas de estreitamento ou calcificações severas.

    • Também é comum fazer projeções multiplanares com “along the vessel” (ao longo do vaso) para visualizar o contorno interno e “straightened vessel” (desdobrado) para medir facilmente em sequência.

Na imagem inferior esquerda do carrossel (imagem 4), há reconstrução do trajeto aorto-ilíaco com indicação de medições transversais — é ilustrativo de como avaliar diâmetros e curvaturas ao longo do caminho vascular.



Critérios Importantes de Avaliação

EstruturaParâmetro-chave
Anel aórticoDiâmetro máximo e mínimo, área e perímetro
Seios de ValsalvaDiâmetro médio e simetria
Junção sino-tubularDiâmetro e relação com seios
Altura dos óstios coronarianosDistância mínima até o anel (risco de obstrução)
Acesso femoralDiâmetro interno mínimo ≥ 5,5–6,0 mm para dispositivos padrão
CalcificaçãoGrau e distribuição (impacta tipo de prótese e acesso)

Cuidados e Observações

  • ECG-gating recomendado na fase cardíaca (prospectivo ou retrospectivo), reduzindo artefatos de movimento e permitindo reconstruções multiplanares precisas.

  • Verificar função renal (creatinina e eGFR) antes da administração do contraste.

  • Garantir sincronização respiratória adequada e apneia eficiente durante o disparo.

  • Verificar extravasamento durante o teste de injeção, principalmente em pacientes idosos e com veias frágeis.

  • Reconstruções 3D e MPR são indispensáveis para o planejamento cirúrgico (volume rendering, curved MPR, centerline analysis).

Resumo Operacional

Região anatômica: Da base cardíaca até as artérias femorais comuns.
Aquisição: Duas fases (valvar/aórtica e acesso periférico).
Contraste: 80–100 mL @ 5 mL/s + flush salino.
Sincronização: Bolus tracking na aorta ascendente (150 HU).
Punção: Veia antecubital direita com cateter 18G.
Objetivo final: Mensuração anatômica precisa e avaliação de vias de acesso para implante da prótese TAVI.

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